18 janeiro, 2012

Não, não vai ficar tudo bem.

Esta noite, ao meu lado, no comboio para casa, vinham um homem e uma mulher ao meu lado.

Ela não parava de chorar. Tentava esconder a cara com o cachecol que trazia, tentava não fazer barulho, não incomodar, mas não conseguia conter-se. As lágrimas escorriam-lhe pela cara abaixo.
O homem que estava com ela não tinha palavras para a consolar. Também não dizia para parar de o fazer. Via-se que era um caso grave, tão grave que as palavras entre eles não eram trocadas. Um silêncio.

A mim só me apetecia agarrar na mão da senhora e dizer-lhe "O que quer que lhe tenha acontecido, há-de correr bem. Não se preocupe, as coisas não são tão más como às vezes nos parecem. Vai tudo correr bem.". Mas fiquei no meu canto, não queria intrometer-me na vida da senhora com as minha tretas de pensamento positivo. Ela já devia ter problemas que chegassem, não precisava de uma abelhuda a chatear. A verdade é que eu tenho um problema: se alguém chora ao pé de mim, quem quer que seja, em breve começo eu também a chorar. Fatal e incontrolável como o destino. E quando a coisa do meu lado já estava a começar a descambar, surge a minha paragem, que era a do casal também.

Enquanto esperávamos que o comboio parasse e as portas abrissem, percebi a conversa que o senhor estava entretanto a ter com alguém ao telemóvel. "(...) teve de levar o filho ao hospital e ele acabou por falecer."

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Não, as coisas não se vão resolver. Nunca mais. Não vai ficar tudo bem.

Calei-me para dentro. Lembrei-me de quando se perde alguém tão próximo, como os irmãos (ou um filho, no caso). E as coisas não "ficam bem", "não vão correr bem". As lágrimas escorrem sem darmos por elas, a cara só se quer esconder nesse escuro que fica a vida, nesse buraco que aparece por implosão do mundo que acaba de desabar. Sempre a cair sem nunca mais batermos no chão.

Mas um dia tocamos com os pés no chão. Sentimos o solo firme. Poisamos os pés. Fincamo-los com vontade. Esticamos os joelhos. Erguemos a cabeça. Abrimos o peito. Damos um passo, e outro e mais outro. E a vida continua a caminhar com o tempo. Passamos a pertencer a esta irmandade de Pessoas-Com-Buracos-No-Peito que se reconhecem no comboio pelas lágrimas que escorrem desgovernadas.

As coisas não se resolveram nem melhoraram. Nem se esqueceram. O tempo é que passa e ainda temos "uma noite para passar". E, por isso, ordenamos às lágrimas que não escorram e à cara que não se esconda e ao coração que continue a bater.

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